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É tempo de consumir

Andrea Wellbaum | 2008-01-14, 11:41

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Diferentemente do Brasil, onde o Natal e o Ano Novo são a cerimônia de abertura de mais uma temporada deliciosa de verão, aqui as festas são um dos únicos pontos altos do inverno. Portanto, quando a época de festas termina, começa um período melancólico de hibernação.

Mas os habitantes do hemisfério norte encontraram uma forma bem feminina de afugentar a depressão: a temporada de liquidações! Tudo começa logo depois do Natal, dia 26 de dezembro, no chamado Boxing Day.

O nome sempre me intrigou. Outro dia ouvi uma explicação bastante condizente com a realidade atual: a troca de caixas (boxes) de presentes, ou seja, o dia em que você troca aquilo que não te serviu (em tamanho ou em gosto).

Mas a Wikipédia dá uma outra explicação para o Boxing Day, que dataria da Idade Média e seria o dia em que as pessoas mais abastadas dão presentes aos empregados ou à²õ pessoas de classes sociais mais baixas. Porém, a prática parece ter sido totalmente esquecida numa das terras mais consumistas que conheço e atualmente todos estão muito mais preocupados em aproveitar o dia para dar presentes para si mesmo.

As "winter sales", no entanto, têm seus atrativos. E a abertura não está entre eles. Quando cheguei em Londres prometi a mim mesma que um dia eu enfrentaria o frio e a escuridão de uma madrugada do dia 26 só para participar daquele momento que TVs em todo o mundo exibem, de pessoas na porta de lojas de departamentos como Harrods e Selfridges correndo e se acotovelando entre o mar de gente para garantir bolsas e outros artigos de marcas caras (muitas vendidas posteriormente no eBay).

Levanto as mãos para os céus em agradecimento por meu espírito consumista não ter chegado a tal ponto e após quatro liquidações de inverno esta idéia 'de participar das manias londrinas' nunca mais ter passado pela minha cabeça...

Mas, vamos à²õ vantagens: diferentemente do Brasil, a palavra liquidação realmente é levada ao pé da letra. Nada de anúncios de "descontos de até 50%" e entrar na loja e perceber que apenas a peça de roupa mais encalhada e horrível está pela metade do preço enquanto que todos os outros artigos têm descontos de no máximo 10%.

É na temporada de winter sales que tenho coragem de entrar em lojas que considero caras o ano todo e me dar ao luxo de comprar peças de qualidade por um preço que não desperta em mim o sentimento de ter sido explorada. Além disso, existem as irresistíveis barganhas: peças que custam três ou até quatro vezes menos do que custavam até o dia 24 de dezembro.

Até agora consegui me conter e nem passei perto das lojas (apesar de já ter comprado um casaco de frio pela metade do preço mesmo antes da temporada de liquidações, já que várias lojas andaram se antecipando nos descontos para aumentar as vendas de Natal), pois é praticamente impossível evitar a compra de algo desnecessário só pelo prazer de comentar com os amigos que você comprou por quatro vezes menos do que o preço original...

E quem acha que as liquidações se limitam a bolsas, sapatos e roupas está enganado. Para quem está montando ou redecorando a casa, lojas de móveis veiculam anúncios tentadores, como sofás de 999 libras por 499. Para quem quer preparar a lista de leitura para 2008, lojas de livros exibem descontos em grande parte das obras, incluindo best-sellers e lançamentos.

Até supermercados, como uma das maiores redes britânicas, o Tesco, propagandeiam produtos pela metade do preço. E para aqueles que resolveram aproveitar demais todos os descontos, os bancos também entram na onda, com imensos cartazes de "sales" em seus cartões de crédito e empréstimos.

As liquidações duram "até o fim dos estoques" ou normalmente até o fim de janeiro, sendo que os preços vão ficando cada vez menores (atualmente, os descontos já estão em 70%). E se nunca participei do começo das winter sales, sempre dou um pulinho nas lojas no final, já que é hora da "xepa" e o que sobrou pode não ser o objeto de desejo de muita gente, mas à²õ vezes é justamente o que faltava no meu guarda-roupa. E por um preço inacreditavelmente irrisório!

°ä´Ç³¾±ð²Ô³Ùá°ù¾±´Ç²õDeixe seu comentário

  • 1. à²õ 11:44 AM em 16 jan 2008, Chico escreveu:

    Vamos fazer um lixão na lua,logo o preço dos produtos devem aumentar.Será que teremos lua cheia?

  • 2. à²õ 12:54 PM em 18 jan 2008, Emerson escreveu:

    Interessantes observacoes, mas nao acho que aqui em UK nao sao colocadas as pecas encalhadas em liquidacao. Passei na Selfridges semana passada, e tudo que estava em liquidacao me pareceu datado. Todas as pecas de design atraente nao estavam em liquidacao.

  • 3. à²õ 03:32 PM em 20 jan 2008, Player escreveu:

    Otima oportunidade para comprar uma ou mais peças de um bom design como por exemplo: Alexander McQueen, pela metade do preço.

    Vale a pena!

  • 4. à²õ 09:40 PM em 21 jan 2008, Vianna escreveu:

    Engraçado esse mundo.Para isso a sociedade inglesa invadiu e pilhou o terceiro mundo, saqueou navios espanhois no século XVII,destruiu os teares indianos no século XIX. Para que todo mundo adotasse o britain way of life ? Inclusive no campo das genealogias pseudo aristocráticas ?

  • 5. à²õ 02:47 AM em 23 jan 2008, Altino Correia escreveu:

    Quando estive em Londres há vinte
    e poucos anos, não era uma época favorável para as compras com vantagens excepcionais como ocorre no período posterior ao Natal. Mas o que mais me chamou a atenção foram os
    "Brechós", onde os visitantes - em especial os brasileiros - podem
    comprar ternos de casemira inglesa por preços irrisórios. Para comprovar eu mesmo comprei um terno de meia estação que fez muito sucesso no Brasil. E o custo foi equivalente
    ao valor de uma calça ou de uma boa camisa social.

  • 6. à²õ 08:50 PM em 30 jan 2008, Renato de Lima da Costa escreveu:

    Em tempos pós-modernos, a aquisição de bens define quem é o indivíduo que o compra. Tomando posse de bens que em sua maioria são supérfluos, ou seja, desnecessários, o homem pós moderno busca exclusividade e valor em eletrônicos, carros e grifes da moda. Tendo seus afetos manipulados e seus desejos aguçados, crê, indubitavelmente, que o materialismo pode, de fato, lhe conferir um grau a mais de status social. Talvez se a grande maioria soubesse que ao adquirir uma determinada mercadoria estariam também fortalecendo a desigualdade social e a exploração do trabalho forçado em países de terceiro mundo, onde as grandes indústrias concentram suas atividades devido ao baixo custo com a mão de obra, muitos poderiam sentir um certo protesto interior, pois é este o sentimento que milhões de trabalhadores engolem calados no meio do vapor e da fumaça, debaixos da tutela e do bom grado dos senhores de fábricas fordistas. Somente assim consumir deixaria de ser uma atividade prazerosa para se tornar o mais penoso trabalho.

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