Irã e Coréia, dez anos atrás
Muita coisa pode mudar em uma década, que o digam Irã e Coréia do Norte. Diante das tensões atuais, envolvendo especialmente seus avanços na área nuclear, poucos se lembram que os dois países viviam um processo de aproximação com o Ocidente no início deste século.
Em outubro de 2000, o governo do presidente americano Bill Clinton chegava ao fim, e sua secretária de Estado, Madeleine Albright, fazia história. No melhor espírito pacificador pós-Guerra Fria, e dançou com um grupo de crianças norte-coreanas. Parecia que as transformações da década anterior no Leste Europeu chegariam finalmente à dividida península coreana. Um mês antes de sua visita a Pyongyang, o mais importante contato entre Estados Unidos e Irã desde a revolução islâmica de 1979. Naquele mesmo ano, a secretária de Estado havia pedido desculpas ao regime em Teerã pelo apoio americano ao golpe de Estado de 1953, que derrubou o primeiro-ministro Mohammad Mosaddegh e recolocou no poder o xá Reza Pahlavi. Já no governo de George W. Bush, o líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, nos Estados Unidos.
Na época, o presidente iraniano era o reformista Mohammad Khatami, e tudo parecia indicar que as relações entre Washington e Teerã seriam mais amistosas. Após o Talebã, de quem o regime iraniano é inimigo antigo, ter sido derrubado do poder no Afeganistão, o Irã participou de discussões com o governo americano sobre o futuro político do país. Aqui em Londres, o governo britânico também via o presidente Khatami com simpatia. Duas semanas após os atentados da Al-Qaeda nos Estados Unidos, , para mostrar que o Ocidente contava com a ajuda iraniana contra o Talebã. Era o primeiro encontro de um líder do regime islâmico iraniano com um alto representante da Grã-Bretanha, potência que no passado também conspirou em favor do xá.
O que aconteceu para que o processo de aproximação entre o Ocidente e a Coréia do Norte e o Irã fosse interrompido? Obviamente, há muitos elementos dentro do regime iraniano que nunca desejaram tal aproximação, e é impossível decifrar o que se passa na cabeça do coreano Kim Jong-Il. Estamos falando de dois regimes cuja própria existência baseia-se, em boa parte, no confronto com o mundo exterior. Mas é fato que a mudança de rumos deu-se após a chegada de George W. Bush à Casa Branca e, mais especificamente, depois de seu primeiro discurso do Estado da União. Em janeiro de 2002, enquanto o então presidente sul-coreano e vencedor do Nobel da Paz, Kim Dae-Jung, lutava para manter o diálogo com seus vizinhos comunistas, e o reformista Khatami tentava vencer as disputas internas com os conservadores iranianos, Bush ignorou os esforços progressistas nas duas regiões.
Depois disso, não houve praticamente avanços diplomáticos nos dois casos, pelo contrário. Em 2003, a Coréia do Norte retirou-se do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, e em 2006 anunciou ter testado com sucesso sua primeira bomba atômica. Um ano depois, a Coréia do Sul elegeu como presidente Lee Myung-Bak, um conservador contrário à política de aproximação com o norte. No Irã, a abertura tentada por Mohammad Khatami foi progressivamente perdendo força, e o país entrou em embate com a agência nuclear da ONU. Em 2005, um relativamente obscuro prefeito de Teerã, o conservador Mahmoud Ahmadinejad, venceu as eleições presidenciais. Era o fim das tentativas de reformas no regime iraniano.
Nos últimos anos, a história tem sido praticamente a mesma, a não ser pela mudança de comando nos Estados Unidos. Barack Obama prometeu melhorar as relações de Washington com o resto do mundo, incluindo seus inimigos históricos. Mas os ressentimentos e as tensões continuam e, aparentemente, devem permanecer ainda por bastante tempo.