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Arquivo para maio 2008

A (ótima) televisão britânica

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Iracema Sodre | 15:36, quinta-feira, 29 maio 2008

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Uma grande amiga minha passou mais de um ano morando aqui em Londres sem televisão em casa.

Em várias conversas nossas eu me pegava perguntando: "Você viu ontem o documentário sobre as crianças com problemas de comportamento?" ou "E o último programa do Derren Brown?" E ela nem sabia do que eu estava falando, obviamente. (Do Derren Brown, agora, ela já sabe. Ficou tão curiosa com os feitos do mágico/ilusionista psicológico/hipnotizador, que foi correndo procurar os programas dele no YouTube).

É claro que a televisão aqui também foi inundada com os reality shows que assolam o mundo inteiro e acabam substituindo coisas mais interessantes (mais um parêntese aqui para confessar que sou fã de alguns deles), mas ainda está anos luz à frente da TV aberta brasileira.

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Tudo bem que aqui todo mundo que tem um aparelho de televisão em casa tem que pagar uma taxa, a licence fee, que é usada para financiar a ³ÉÈËÂÛ̳ doméstica e que garante a independência da organização em relação a interesses comerciais e políticos. Por isso e pela qualidade dos programas apresentados, em geral, eu pago de bom grado os R$ 466 anuais.

Às vezes, tem tanta coisa boa na televisão ao mesmo tempo, que já aconteceu de eu assistir a um programa, ficar de olho nos canais +1, que repetem a programação uma hora depois, e ainda gravar um documentário apresentado pelo Stephen Fry (foto) ou pelo Jonathan Ross.

Foi através da TV que eu entendi melhor o humor britânico e a obsessão pelo mercado imobiliário e pelos jardins, que eu descobri mais sobre como funcionam o governo e a sociedade por aqui, que eu tomei gosto pela cozinha e passei a respeitar os chefs britânicos.

Por tudo isso, acho que a minha amiga anti-televisão perdeu uma boa chance de descobrir mais sobre a cultura britânica e de assistir a programas e documentários de primeiríssima qualidade.

O meu, o seu, o nosso carro em Londres

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Pablo Uchoa | 12:16, segunda-feira, 26 maio 2008

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Entrei num desses esquemas que chamam por aí de "propriedade compartilhada" de um carro.

"Propriedade compartilhada" é modo de dizer - na verdade, o esquema é uma maneira fácil e descomplicada de poder usar um carro quando quiser, sem a chatice e o custo de ir a uma locadora e pagar o preço de uma diária completa.

A subprefeitura de Hackney, que anuncia o - privado - em seu website diz que cada carro usado nesse esquema tira seis outros de circulação, porque os usuários acabam evitando comprar seu próprio veículo.

Alivia-se assim um dos principais problemas das grandes cidades, algumas que, como São Paulo, por exemplo, correm o risco de "parar" dentro de alguns anos, se se confirmarem as previsões mais pessimistas.

Resolvi inaugurar o ²õ±ð°ù±¹¾±Ã§´Ç alugando uma van para fazer uma mudança de casa. A reserva pode ser feita via internet ou por telefone até 30 minutos antes da hora marcada.

Os carros ficam parados na rua em vagas próprias - só nas proximidades da minha casa há uma dúzia a minutos de caminhada. Após o registro e a verificação de documentos, cada usuário recebe pelo correio um cartão magnético que lhe permite entrar no carro, introduzir uma senha e dar a partida.

Gostaria de ter tido algum imprevisto que rendesse uma história picante ao leitor, mas confesso que o procedimento foi simplesmente tranqüilo. Fazia um dia ensolarado em Londres, dos poucos que temos a cada ano, e terminei a mudança um par de horas antes do previsto.

streetcar2.JPG

Aproveitei a van para passear no Southbank e tomar um sorvete fazendo cena ao lado dos conversíveis que emparelhavam no semáforo. Devolvi o carro e poucos minutos depois apareceu um simpático casal que utilizou o automóvel depois de mim. Voltei a usar um carro de passeio poucos dias depois.

Não sei se esse tipo de esquema adiantaria em um lugar como São Paulo, onde a infra-estrutura de transporte fica muito aquém da demanda, para dizer o mínimo, e o crescimento econômico já permite que consumidores dirijam 6 milhões de carros pela cidade. Os índices de congestionamento medidos pelas autoridades de trânsito batem recorde após recorde.

Em Londres, onde o sistema de transporte, por mais reclamação que suscite, é abrangente e variado, e onde ir de carro para o trabalho é dispendioso e pouco prático, o mais comum é que o veículo seja utilizado assim, em pílulas, para uma finalidade ou um programa pontual.

Não sei se sou exemplo para a estatística da prefeitura de Hackney segundo a qual um carro "compartilhado" tira outros, próprios, de circulação - provavelmente, em outra circunstância, eu continuasse simplesmente não dirigindo.

Seja como for, para um apaixonado pelo volante como me considero, ainda divertindo-me com dirigir na mão oposta e com passar a marcha com a mão esquerda, o esquema pelo menos é uma maneira de matar as saudades da estrada. De consciência limpa porque estou colaborando com a sustentabilidade da circulação viária na cidade, e aproveitando que por ora o título de vilãs do aquecimento global são as emissões de carbono dos aviões.

Caçando morcegos

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Daniel Gallas | 16:13, terça-feira, 13 maio 2008

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Ingresso é sempre um problema. Essa é uma das lições que eu não canso de aprender em Londres. Aqui, nem sempre se pode fazer o que vem à cabeça, pois o risco de se topar com um cartaz "sold out" é grande.

Até mesmo eventos aparentemente menos populares, como uma caminhada coletiva à procura de morcegos, exigem planejamento prévio.

Não, eu não inventei isso. Na semana passada, o Parque de Dulwich, no sul de Londres, a algumas quadras da minha casa, ofereceu um passeio noturno na companhia de especialistas em morcegos.

Não sei se foi o inusitado da coisa, ou se foram as recomendações que recebi de um colega que já havia feito o passeio, mas resolvi dar uma chance aos morcegos.

Infelizmente, resolvi fazer as coisas da forma não-londrina, sem comprar ingressos antes. Cheguei cinco minutos depois da "bat-hora" que estava anunciada no cartaz e me dei mal: "sold out".

Cordialmente, uma funcionária do parque me disse que eu não poderia participar da palestra prévia com os especialistas e nem do comes-e-bebes preparado para o evento. Mas, se quisesse, poderia me juntar ao grupo quando começasse a caminhada.

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O sucesso do evento me impressionou. Além das 50 pessoas organizadas e pontuais que compraram o ingresso antecipado e compareceram na hora, outras 50 ficaram na mesma situação que eu e se anexaram ao grupo.

Éramos cem pessoas em plena noite quente de sexta-feira vagando pelo parque com lanternas e "bat-detectores" - uma espécie de rádio que capta os sons dos diferentes tipos de criaturas.

A verdade é que para mim um "tour de morcegos" desses pode ser algo estranho, mas para quem é britânico imagino que faça mais sentido e tenha um apelo interessante.

Os britânicos são obcecados com seus jardins e parques. Um panfleto distribuído no começo do evento ensina os participantes a identificar os diferentes tipos de morcegos e torná-los aliados na conservação de plantas e jardins (você sabia que um morcego pode comer até três mil insetos em apenas uma noite?).

Os mais interessados podem ligar para um "Bat-Fone", onde recebem orientações mais aprofundadas sobre como criar um "porto seguro para morcegos no seu próprio jardim". E quem estiver um nível acima disso pode se filiar ao Programa Nacional de Monitoramento de Morcegos e ajudar a Grã-Bretanha a descobrir novas espécies.

Aos poucos, estou descobrindo que não existe evento aparentemente menos popular aqui. Também já estou consultando a programação de maio de 2009.

Londres não é mais a mesma...

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Andrea Wellbaum | 19:25, terça-feira, 6 maio 2008

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No começo do ano, a ministra do Interior britânica, Jacqui Smith, causou polêmica ao admitir que não se sente segura para andar nas ruas de Londres durante a noite, seja em Hackney - uma área com uma população menos abastada e com índices de criminalidade relativamente altos - ou em Chelsea - um dos bairros mais chiques da cidade.

Na época, os principais partidos de oposição se aproveitaram da declaração para criticar o governo trabalhista - do qual Smith faz parte -, de ter deixado a criminalidade aumentar e ter feito com que os habitantes de Londres fossem privados de um privilégio que moradores de outras metrópoles como Nova Iorque, Paris, Berlim e Tóquio ainda teriam.

Apesar de os números mais recentes da polícia metropolitana de Londres mostrarem que o índice geral de criminalidade caiu (embora o número de crimes com armas tenha aumentado) hoje um episódio mostra que a cidade não é mais a mesma, incluindo o Chelsea.

Houve um tiroteio entre policiais e homens armados em plena King's Road - considerada uma das ruas mais chiques de Londres, com lojas caríssimas, freqüentada por muitas pessoas que podem comprar nelas.

Como o incidente ocorreu há duas horas do momento em que estou escrevendo este post, ainda existem poucos detalhes. Aparentemente, tiros foram disparados de dentro de uma joalheria e a polícia na área revidou.

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Ambulâncias de prontidão na King's Road, nas proximidades do tiroteio

Os canais locais, especialmente a SkyNews, estão fazendo uma cobertura à la "Cidade Alerta" e confesso que não tenho saudades deste tipo de programa, por dois motivos: porque exploram a desgraça dos outros e porque mostram que desgraças acontecem.
O ideal seria viver em uma cidade onde elas não acontecem e é triste ver na televisão que Londres não é uma delas...

Eu já tinha percebido a cidade diferente quando voltei de uma temporada no Cairo, há pouco mais de seis meses. Nos mudamos para Holloway, que, por um lado obviamente é longe de ser um Chelsea, mas também não é considerado complicado como Hackney.

Um noite, voltando por volta das 23h da minha aula de yoga, desci do ônibus e subi a pé a Caledonian Road. Em menos de cinco minutos estaria no conforto de casa. Porém, um adolescente desocupado resolveu me meter em uma situação para lá de desconfortável antes disso.

Era um destes "hoodies", como são chamados aqui os trombadinhas, e assim que ele me avistou do outro lado da rua, saiu do ponto de ônibus e grudou do meu lado - literalmente. Eu gelei. Não era algo que eu esperava acontecer comigo em Londres e eu me senti extremamente vulnerável.

Em São Paulo, já passei por várias tentativas de assalto no trânsito ou no farol e sempre me refugiei na proteção do carro, quaisquer fossem as minhas reações no momento (já foram várias, desde fechar o vidro na mão do cara até mandá-lo para o inferno aos berros e vê-lo sair correndo assustado com minha reação inesperada). Mas ali estava eu, na Londres onde eu costumava andar sem medo às 2h da madrugada, com um trombadinha do meu lado falando que me seguiria até em casa se eu não passasse minha bolsa para ele.

O que eu deveria fazer? Gritar por socorro? Sair correndo? Não gritei, porque fiquei com medo de ele ter uma faca a tiracolo (muitos crimes aqui são cometidos com facas). Não corri, porque supus que depois de uma cansativa aula de yoga ele me alcançaria em um piscar de olhos.

Como meu marido sempre me disse que sou muito explosiva, resolvi não reagir. Aliás, ignorei o hoodie e fingi que ele não estava ali - apesar de meu coração bater desesperadamente e os dois quarteirões até em casa terem parecido estar a quilômetros de distância. Vi que ele foi ficando nervoso com a minha não-reação, falando mais perto do meu rosto, com mais raiva, quando... fui salva pelo ônibus do infeliz, que passou pelo ponto que ele tinha abandonado para me importunar. E lá foi o moleque correndo enlouquecidamente para pegar o ônibus.

Cheguei em casa chorando e não sei se chorava mais por causa do susto ou por ter sido o primeiro dia em que comecei a não me sentir mais tão segura em Londres.

London Freeze

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Carolina Oliveira | 15:28, sexta-feira, 2 maio 2008

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Na quarta-feira pela manhã um amigo me mandou esse link:

Ali diz, "Prepare uma pose para o London Freeze, 30 de abril 2008, estação de Liverpool Street, 18:24 - 18:28. Espalhe".

Não entendi muito bem, mas percebi que era um chamado para algo parecido com os "flash mobs", em que um grupo de pessoas se encontra de repente em um lugar, faz alguma ação meio estranha e sem sentido aparente por alguns minutos (como guerra de travesseiros, aplausos, ou até uma 'festa' em que cada pessoa dança ao som de seu iPod) e depois se dispersa rapidamente.

As pessoas ficam sabendo dessas intervenções por links ou e-mails, como este do London Freeze, que são repassados de amigo para amigo.

Fomos então, eu e a Ilana Rehavia, armadas com câmeras de vídeo, para ver o que ia acontecer na estação de Liverpool Street.

Chagando lá, já dava para sentir um certo clima de expectativa no ar. O saguão da estação estava lotado de gente de olho no relógio e vários curiosos com câmeras a postos, só esperando o ponteiro chegar no 18:24.

Chegou. De repente dezenas de pessoas viraram estátuas. Criatividade é o que não faltou nas escolhas das poses.freeze203.jpg

O mais engraçado foi ver as reações dos que ficaram de fora da brincadeira, sem a menor idéia do que estava acontecendo ali.

Às 18:28 em ponto, os que estavam congelados descongelaram e a estação foi inundada por uma salva de palmas.

Foi surreal.

Assista aqui ao vídeo.

Eleições 'coloridas' em Londres

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Iracema Sodre | 22:01, quinta-feira, 1 maio 2008

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Foi a primeira vez que a população se envolveu tanto numa eleição para prefeito em Londres. O voto não-obrigatório e as rígidas regras que limitam a propaganda eleitoral impediram que a cidade fosse engolida pelo carnaval das campanhas que é feito no Brasil e em outros países.
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Mas, desta vez, os três principais candidatos eram considerados personagens interessantes ou "colourful", como diria a mídia daqui, e a disputa foi apertada.

O atual prefeito, Ken Livingstone, do partido Trabalhista (centro na foto), não perde oportunidade de se meter em uma polêmica. A minha preferida foi a luta dele contra os pombos de Trafalgar Square, bem no centro de Londres. Ele chamou os bichos de ratos com asas, enfurecendo os muitos habitantes da cidade que alimentam os pombos com farelos de pão e os tratam como parte da família.

Ele também enfrentou os críticos e colocou em prática o "congestion charge", uma taxa de cerca de R$ 25 paga por carros que circulam no centro e no oeste da capital e que tem como objetivo desafogar as ruas engarrafadas de Londres.

Ken também fala o que vem à cabeça. Mesmo que depois tenha que desdizer o que disse antes, sem perder a pose jamais.

Seu principal opositor nas urnas, Boris Johnson, do partido Conservador (à direita na foto), é quase uma celebridade local. Ele estudou nos tradicionalíssimos Eton College e Universidade de Oxford, já apresentou programas de televisão, editou uma revista e é especialista em gafes, como diriam seus críticos.

Declarações ofensivas de Boris conseguiram irritar cidades inteiras, como Portsmouth ("cidade cheia de drogas, obesidade e parlamentares trabalhistas"); Liverpool (ao dizer que a população teve uma reação exagerada quando um conterrâneo foi morto por rebeldes iraquianos); o famoso chef Jamie Oliver ("eu me livraria dele") e o governo de Papua Nova Guiné ("por dez anos, nós conservadores nos acostumamos a orgias de canibalismo e matança de líderes ao estilo de Papua Nova Guiné").

O terceiro candidato com mais chances, entre os dez que estavam concorrendo, é o liberal democrata, ex-chefe da polícia e homossexual assumido, Brian Paddick (à esquerda na foto).

Em 2002, ele foi acusado por um ex-namorado de ser usuário de maconha. Paddick foi afastado do cargo enquanto as alegações eram investigadas, mas centenas de pessoas foram às ruas para pedir a volta dele. Ele foi inocentado das acusações.

Em 2005, ele brigou com o chefe da polícia londrina, Sir Ian Blair, por causa da maneira como o caso da morte de Jean Charles de Menezes foi conduzido.

Inegavelmente, era uma eleição de personalidades fortes e muita excentricidade que mexeu com a cidade. Pena que eu não tenho passaporte britânico para poder votar...

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